Ética:
É o modelo de conduta humana capaz de guiar o indivíduo. Em sentido filosófico,
é a disciplina cujo objeto são os juízos de apreciação quando se aplicam à
distinção do bem e do mal. A ética vem ordenar a conduta, ou seja, normatizar
uma ação.
Bioética:
É uma disciplina autônoma, pois não se preocupa em ser exata, como uma ciência,
e considera a diversidade, a pluralidade de realidades e reflexões como a sua
base. É a ética da vida (Bio+Ética), que pode ser dividida em Macro-bioética, que
seria a ética que visa o bem da vida e estaria diretamente ligada ao meio
ambiente a ao Direito Ambiental; e Micro-bioética, esta, por sua vez, surgiria
de uma restrição do objeto da bioética. Seria a ética da vida humana. Neste
contexto, bioética seria um modelo de conduta que procurasse trazer o bem à
humanidade como um todo e, ao mesmo tempo, a cada um dos indivíduos componentes
da Humanidade.
Biodireito:
É a positivação das normas bioéticas, ou seja, a positivação jurídica de
permissões de comportamentos médico-científicos, e de sansões pelo
descumprimento destas normas. Também pode ser entendido no sentido de abranger
todo o conjunto de regras jurídicas já positivadas e voltadas a impor ou
proibir. Assim, Biodireito é o conjunto de leis positivas que visam estabelecer
a obrigatoriedade de observância dos mandamentos bioéticos, e, ao mesmo tempo,
é a discussão sobre a adequação desta legislação.
Os principais
princípios do Biodireito são os princípios da autonomia, da beneficência, da
sacralidade e da justiça.
Principio
da Autonomia: É o principal principio, pois todos os demais estão
vinculados a este, refere-se à capacidade de autogoverno do homem, de tomar
suas próprias decisões, está diretamente ligado ao livre consentimento do
paciente na medida em que este deve ser sempre informado. Pelo princípio da
autonomia, o individuo tem o direito de decidir sobre as atividades que
impliquem alterações em sua condição de saúde física e/ou mental.
Principio
da Beneficência: Também identificado por principio da não-maleficência, uma
vez que este ordena ao médicos e cientistas que se isentem de qualquer
atividade que possa vir a causar algum mal despropositado ao paciente, trata-se
de proibir condutas que sejam capazes de geram algum maleficio ao paciente. “Aplicarei
os regimes para o bem dos doentes, segundo o meu saber e a minha razão, e nunca
para prejudicar ou para fazer o mal a quem quer que seja” (Juramento de
Hipócrates).
Principio
da Sacralidade: A vida humana deve ser sempre respeitada e protegida contra
agressões indevidas. Daniel Callahan identifica cinco elementos essenciais para
a consideração da sacralidade da vida humana: 1) sobrevivência da espécie
humana; 2) preservação das linhas familiares; 3) direito de os seres humanos
terem proteção de seus companheiros; 4) respeito por escolhas pessoais e
autodeterminação, que inclui integridade mental e emocional; 5) inviolabilidade
corporal. Assim, o ser humano deixa de ser objeto e passa a ser um valor
considerável em si mesmo, impedindo-se práticas como a comercialização de
órgãos, tecidos, sangue e esperma, impondo-se a gratuidade da doação destes,
servindo de fundamento para o principio da beneficência.
Princípio
da justiça: pode-se dividir este principio em três questões básicas: 1) o
ônus do encargo da pesquisa cientifica, onde todos os membros da sociedade
devem, de forma igualitária, e na medida de suas forças, arcar com o ônus da
manutenção das pesquisas e da aplicação dos resultados; 2) a aplicação dos
recursos destinados à pesquisa, este implica em uma distribuição justa e equitativa
dos recursos financeiros e técnicos da atividade científica e dos serviços da
saúde, não só para a solução dos problemas do primeiro mundo, mas também para a
busca de soluções para problemas típicos dos países subdesenvolvidos; 3) a
destinação dos resultados práticos obtidos destas pesquisas, a ciência deve ser
aplicada de forma igual para todos os membros da espécie humana, não devendo
existir distinção em função de classe social, ou capacidade econômica daquele
que necessita de tratamento médico.
Muitas
questões éticas têm sido levantadas diante da pandemia causada pelo
Coronavírus. Muitas delas têm um caráter eminentemente bioético por estarem
ligados à resposta dada à pandemia pelos agentes de saúde publica e a atenção
medica prestada aos enfermos com Covid-19. A velocidade da difusão do vírus
exige respostas rápidas apropriadas para uma situação de emergência sanitária.
Diante de uma
pandemia com grande impacto sanitário, o sistema público de saúde é o primeiro
a sofrer tal impacto. É preciso considerar que nenhum sistema de saúde está
preparado para um surto de tamanhas proporções, é6 preciso considerar, ainda,
que outras enfermidades não param de ocorrer. No Brasil, o Sistema Único de
Saúde (SUS) opera no seu limite, geralmente próximo a sua capacidade total, o
sistema complementar (hospitais privados) atende uma parcela da sociedade que
tem convênios aos planos de saúde ou altos recursos financeiros, mas ao se
tratar de uma pandemia, o sistema complementar também tende a se esgotar. Desta
forma o desafio ético aqui está relacionado diretamente à questão da justiça e
da equidade no acesso aos serviços de saúde e na distribuição dos riscos e
benefícios na sociedade com um sistema esgotado pela desproporção entre a
necessidade dos pacientes e a distribuição dos recursos limitados.
Um grande número
de pessoas precisando de assistência médica, com escassez de recursos, cria um
dilema ético de como essa assistência pode ser distribuída de forma eficaz e
equitativa. Profissionais de saúde são treinados para proporcionar cuidados
clínicos centrados na necessidade de seus pacientes, com os quais tem uma
responsabilidade moral. O contexto de emergência decorrente de uma pandemia
obriga que o foco do cuidado passe da centralidade dada ao paciente individual
à saúde da população, em vista de promover o bem comum. A alocação de recursos
de forma eficiente, equitativa e dentro dos protocolos clínicos de
proporcionalidade entre a necessidade e o uso eficiente de recursos limitados
precisa ser cuidadosamente considerada para minimizar os danos e maximizar os
ganhos para a saúde da população.
Outra questão
refere-se ao processo de decisão do profissional de saúde diante de várias
pessoas doentes e à escassez de recursos terapêuticos. Os profissionais de
saúde lideram o processo de decisão sobre quais recursos são destinados para cada
paciente. É preciso decidir, em um curto espaço de tempo, entre vários
pacientes em estado grave com Covid-19, qual vai para o leito de UTI
disponível. Protocolos de triagem, alocação de recursos, admissão e
transferência de pacientes, manutenção e interrupção de tratamentos em UTI e
condução para cuidados paliativos podem ser criados. Ademais, bioeticistas
devem estar disponíveis para consultas éticas quando necessário. Essa
preparação auxilia nos processos de decisões para o uso eficiente de recursos destinados
à promoção de saúde da população.
Em todos os níveis da resposta a um surto pandêmico, a dignidade humana deve ser respeitada e protegida. Equidade e justiça distributiva são princípios que devem guiar as decisões de caráter organizacional dos serviços de saúde pública e a alocação de recurso, desde equipamentos médico até a presença de profissionais. Tudo precisas ser realizado com transparência e solidariedade, portanto, a comunicação com os pacientes e seus familiares deve ser clara e honesta.
A situação de um surto pandêmico, e o provável esgotamento da capacidade de assistência à saúde geram grandes questões bioéticas, com decisões difíceis de serem tomadas, mas que não podem ser ignoradas. Muitos doentes não receberão a assistência da mesma maneis que receberiam em condições normais, mas não há nada que justifique seu abandono. Mesmo sem os equipamentos necessários a todos, o mínimo de cuidado sempre é possível por meio da solidariedade e da presença de pessoas que podem promover conforto humano e espiritual. Responder a essa pandemia de forma ética significa também honrar a dignidade humana no processo terminal da vida.
Por Wanderson Arcadi Melo